O que é um vinho de talha?
                                                    
                                                                                    

José João Santos

                                                    
                                                                                                                               

Tal como na gastronomia, também no vinho a tendência é simplificar. As adegas tecnologicamente avançadas e de arquitetura de autor continuam a ter interesse, mas os mais curiosos por vinho estão de olho em tudo o que seja ovos, cimento e barro. Ora, vamos por aí, pelo barro.


O vinho de talha ou ânfora regressou à ribalta mas não é um exclusivo português. A Geórgia, por exemplo, tem beneficiado bastante dessa tradição para colocar aquele país no mapa mundo do vinho. Em Portugal, talha ou ânfora remete-nos desde logo para o Alentejo, embora comecem já a surgir experiências noutras regiões do país. O processo de vinificação de um vinho de talha é muito simples e terá sido implementado pelos romanos, há mais de dois mil anos.

As uvas são colhidas e o fruto é separado do engaço com recurso a tradicionais mesas de ripas de madeira, um processo manual. Podem ainda ser usados desengaçadores elétricos. Películas, mosto e algum engaço seguem para dentro da talha e espera-se que a fermentação arranque de modo espontâneo. À medida que as películas das uvas sobem até à superfície da talha, um singelo rodo de madeira volta a colocá-las na parte inferior. Uma técnica semelhante ao que se usa com um macaco nos lagares. Com isso alcança-se mais cor e mais estrutura no vinho. O exercício chega a ser repetido duas vezes por dia.

O barro é poroso, para o bem e para o mal. Para preservar o mosto de temperaturas muito elevadas usa-se sarapilheira ou panos molhados, que envolvem a talha durante o processo. Convém que a temperatura não exceda os 18ºC.

A fermentação prolonga-se durante uma a duas semanas. Quando termina, as massas concentram-se no fundo da talha, o que ainda demora uns largos dias.

Manda a tradição que a abertura das talhas, por um orifício que funciona como uma torneira, na parte inferior da talha, mas que é afinal um batoque de cortiça, ocorra no Dia de São Martinho, 11 de novembro. Momento de festa, claro, que serve para celebrar o completar de mais um ciclo de vinha e de vinho. O vinho pode ser aí engarrafado, ir diretamente para o copo ou ser colocado em talhas mais pequenas.

Os vinhos de talha são geralmente muito aromáticos e de estrutura simples, que refletem bem o processo de vinificação. Podem ser brancos, tintos ou petroleiros; os brancos terão sempre uma cor amarela dourada e os tintos uma coloração rubi aberta, pouco vincada. Os petroleiros misturam uva branca e tinta. Todos eles são os verdadeiros vinhos de talha. Há situações em que a talha é apenas usada na fermentação. Logo a seguir, o vinho é colocado em barricas de madeira ou de inox para completar o estágio até serem engarrafados.

Mais simples do que um vinho de talha é difícil. Dá quase vontade de fazer em casa… 


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